Pólemos
Rogo a Deus piedade pelas feras que me rodeiam
Feras negra, feras claras
Feras belas, feras feias
Feras da minha mente
Feras da minha alma
Feras das minhas veias
Sigo no meu encalço
Caço-me para domesticar o que há de selvagem dentro de mim
Defronto-me em meu espelho
Não empalideço, nem me avermelho
Só no confronto da solidão de minhalma é que me capituro
É quando me reconheço em duas partes, ponto a ponto
O da pureza e o do impuro
Não mereço meu próprio apreço
Com olhar maduro
Em embaraço me arrependo, me recalcitro,
Me contosso em recomeço
O divórcio de mim mesmo me faria mais seguro
Desalieno-me de mim o quanto posso
Corto minha carne, sangro, deliro
Avesso a minha alma
Pago insuficientemente um preço duro
Meu maior perigo não são as feras que lá fora me espreitam, me esperam
Previsíveis às minhas suspeitas
Essas me atacam, me batem, mas não me abatem
De certa forma me respeitam
Meu maior perigo é a fera em mim que acorrento e não domo
A que, cá dentro, a minha alma se estreita
Fere-me, me corrompe, me oprime, me usa, me repulsa
Treme, geme, brada e urra arraigada dentro de mim
Parecendo estar em meus genes e cromossomos
Meu perigo são as multicaras da minha quimera
Meus desejos impertinentes
Meus quereres que desconsideraram meus deveres
As regras e os queres de outra gente
Meu ego tamanho ter
Minhas vontades indômitas, imprudentes
Corruptas e corruptoras de mim mesmo
Que sem domo e sem brida se desbanderam
Quando me conheço, sou o meu adversário mais renitente
Mais temível, mais astuto, mais fera
Quem me cura e quem me mata sou eu mesmo
Qualquer lado que de mim abato
Dói inevitavelmente em mim
Eu sou a minha maior luta
Eu pareço não ter fim
Arrebento as correntes quando não se espera
Minha maior guerra para poder vencer outras guerras, outras feras
É o meu eu bom neste universo
Versos meu eu ruim.
Sales de Oliveira (07/07/2017)